quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Alívio

Quase um mês sem escrever. Para quem vivia cada dia como se fosse uma eternidade, este mês passou como um minuto. A cirurgia aconteceu no dia 16; uma equipe de anjos retirou os dois tumores (dois sim; o velho era um carcinoma in situ). Graças ao bom Deus, a biópsia do linfonodo sentinela deu negativa e essa equipe de anjos mastologistas não precisou remover os gânglios da axila. Em seguida, uma equipe de anjos artistas reconstruíram a mama. Ficou perfeita, a menos das cicatrizes que vão sumir a seu tempo. Não são pequenas, mas são muito bem localizadas.
Tive pouquíssima dor; fiquei apenas 24 horas no hospital. Ainda fico de molho mais uma semana, durante a qual preciso pensar na vida e o que eu quero fazer com ela de agora em diante.
A única coisa que eu sei é que estou pronta para a próxima fase, e para qualquer outra briga boa como esta.
Deus lhes pague, meus anjos médicos e enfermeiras. Deus abençoe o trabalho de vocês e os recompense por esta escolha. Como diz a Biblia, eles escolheram a melhor parte, e essa não lhes será tirada.

terça-feira, 31 de agosto de 2010

Plantação de cogumentos

A ressonância é boa para mostrar coisas pequenas que escapam da radiografia. Parece que tem mais alguma coisa na mama esquerda que os médicos não sabem o que é. Pelo jeito, vou repetir o ciclo espera-ultrassom-espera-biópsia-espera-anatomopatológico... quando acabar esse ciclo, será que não vai ter nascido nenhum outro cogumelo?

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Demônios e o seu espaço

Se até agora a luta contra o câncer tem me revelado muitos anjos, agora aparecem alguns demônios, como não podia deixar de ser. O mundo não é nada cor-de-rosa.
Pessoas que menosprezam o seu sofrimento (de alma, ainda que o corpo não doa) são fichinha perto das que querem te enterrar. Algumas pessoas se acham no direito de tomar decisões por mim, como se eu não existisse. Outras se apressam para que eu defina logo a minha situação, para ocuparem o meu espaço no trabalho, em tudo que eu faço. Outras querem te visitar, com a maior cara de preocupação, sendo que nunca telefonaram para te cumprimentar no aniversário, como se eu não pudesse morrer sem tê-las visto.
Obrigada mas não, obrigada. Estou muito bem, muito consciente, muito capaz. Estou cuidando muito bem da minha vida e das coisas que eu sempre cuidei.

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Isso não é nada

O câncer de mama é uma doença bastante comum. Quase todo mundo conhece alguém que tem ou que teve, e na grande maioria dos casos, graças a Deus, essas pessoas estão bem, curadas. É portanto comum que as pessoas cheguem para você e digam, "Isso não é nada..." Às vezes, as pessoas dizem isso para você ficar mais tranquila com os vários casos de cura; outras, no entanto, dizem a mesma frase insinuando que você está sendo uma fresca de estar preocupada, fragilizada, sensível. Que você não tem nada que ficar triste, que isso não é motivo para você chorar quietinha no seu canto.
Quem diz isso muito provavelmente não teve câncer. Deve ter convivido com uma de nós, verdadeiras turbinas de força, que nos amarramos com cinta de aço para não despedaçar e espalhar os cacos em volta. E fomos tão convincentes que quem nos rodeia de fato pensa que não é nada! É uma coisinha à toa!
Ter câncer, curável ou não, é foda. É muuuuuito ruim.  A gente enfrenta a doença com muita força e coragem, com disposição e com muita fé porque sabemos que a nossa vida depende demais desta atitude. Se você abaixar a cabeça, o câncer te vence!
Mas, por favor, não venham me dizer que não é nada! Eu prefiro ouvir, "puxa, que legal que você está enfrentando isso com coragem". Ou "você vai sair dessa, mas eu imagino o que você deve estar passando".  Porque se uma pessoa me diz não é nada, acho que ela não ficaria triste se eu desejasse que ela tivesse a mesma coisa... ou ficaria?

sábado, 14 de agosto de 2010

Meu marido

Na alegria e na tristeza, na saúde e na doença. É nessas horas que a gente sabe com quem se casou. Meu marido tem sido meu apoio, meu companheiro, guerreiro até as últimas consequências. Ele tem um jeito alegre, conversador, faz amizade fácil com as pessoas, agrada todo mundo - e me abre as portas, os corações, a boa vontade das pessoas. Toma iniciativas, marca exames, conversa com os médicos, troca idéias, consegue consultas, informações. Ele se faz de forte, mas eu sei o quanto ele está ansioso, até mais que eu. Há momentos em que ele despenca a falar. Há momentos que ele some, vai andar na rua, quer ficar sozinho. É quem me aconchega, quem me sorri o tempo todo, ao mesmo tempo que me provoca e me faz sentir que a vida não mudou em nada, que tudo vai continuar a ser como sempre foi.
Dos anjos que eu tenho encontrado, o maior deles está ao meu lado. Obrigada, meu amor.

Ressonância, show de rock

Meu primeiro exame no novo hospital foi uma ressonância magnética. Nunca tinha feito antes. A ressonância de mama obriga você a deitar de barriga para baixo, com os peitos pendurados dentro de uma cavidade. Dura cerca de 40 minutos durante os quais você precisa ficar imóvel. Não é nenhum absurdo de tempo, nem o bicho de sete cabeças que as pessoas falam. Não vi nenhuma razão para claustrofobia, nem estando o tempo todo com o rosto para baixo sem poder ver nada do que se passava à volta.
As figuras mostram primeiro o equipamento, que é um imã gigante, depois a cama na qual nós deitamos de barriga para baixo. Aquela elevação é para ficar mais confortável, e as mamas ficam penduradas, soltas, no espaço azul da outra figura. Não são apertadas como na mamografia, apenas encostam um apoio para elas não balançarem e atrapalharem o exame. Seu rosto fica apoiado no suporte mais à direita da imagem. Não é desconfortável; os equipamentos mais modernos vêm sendo feitos para respeitar o conforto das pessoas que os usam.

O som, ah isso sim é uma super experiência. Som alto, em frequências diferentes e em ritmos diferentes, repetidos, alternados. Um verdadeiro show. Se tivesse luzes e mais uns instrumentos não ficava nada atrás de um bom show de rock! Veja um exemplo do tipo de som. É curtinho, lá dentro dura muito mais.



O que você pode fazer lá dentro, enquando ouve esses sons? Ocupe a sua cabeça, para não se incomodar com o barulho. Eu me lembrei do Crocodile Rock do Elton John, Pink Floyd, Linkin Park. Reze. Pense nas coisas boas que você fez. E acredite que vale a pena você ficar quietinha, primeiro porque não vai precisar repetir o exame e segundo porque ele é super importante.

O exame em si é um exame complementar aos demais. A ressonância capricha nos tecidos mais moles, então é útil para :
  • verificar o exato tamanho do tumor, permitindo que os médicos preservem ao máximo o tecido da  sua mama;
  • mostrar se há outros tumores que ficaram escondidos nos demais exames, principalmente nas cirurgias que vão preservar a mama;
  • identificar tumores que não foram percebidos antes, principalmente quando a mama é densa (desvantagens das mulheres peitudas, como eu)
  • verificar se o câncer invadiu as paredes do tórax
  • acompanhar os efeitos da quimioterapia
Na primeira fase do exame, ele é feito sem contraste. Nessa fase, ele mostra hematomas, nódulos linfáticos, próteses de silicone arrebentadas, cistos, dutos aumentados (eu tenho um...). Já com o contraste (aquele que dá impressão que você chupou prego enferrujado), o exame mostra mais aspectos da irrigação de sangue na mama. Como os tumores malignos em geral constroem seus vasos sanguíneos, eles ficam ressaltados na imagem. Veja só essa imagem, que espetacular.

Atendida, finalmente.

Estou super feliz de ter sido chamada para o hospital que vai me tratar. A médica que me atendeu ontem na primeira consulta foi mais um anjo, delicada e ao mesmo tempo objetiva. Esclareceu que no meu caso se aconselha a remoção cirúrgica do nódulo e depois radioterapia e quimioterapia, ainda não sei em que ordem. A quimio é necessária porque é grau 3, o que quer dizer que é um tumor que cresce rápido. Serei operada em setembro provavelmente.

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Sem metástases

A tomografia de corpo inteiro não acusou metástases. A notícia veio por telefone, o anjo que é a médica mastologista que me atendeu no 1o. hospital ligou e me deu a notícia pessoalmente. Que Deus abençoe as mãos daquela mulher.

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Angústia

A espera é terrível. Estou há cinquenta dias indo de um médico para outro, de um hospital para outro. Até agora fiz exames, mas nada do tratamento começar. O hospital onde vou me tratar me deu uma perspectiva de me atender em consulta em mais 40 dias, e mais quatro meses para começar a me tratar... até lá, meu câncer já vai ter crescido, minha doença vai mudar de estádio, tudo vai se complicar muito.

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Anjos da guarda

Eu estou muito impressionada com as pessoas que estou conhecendo neste processo todo de diagnóstico do câncer. Cada médico, enfermermeiro, atendente, telefonista, cada um que me atende tem um sorriso, um carinho, um gesto de amizade e de solidariedade. Peço perdão a todos que num dia de mau humor eu possa ter tratado com pouca atenção. Se toda dificuldade é uma oportunidade, esta é a de aprender a ser gente. Lição difícil...

Procurando cogumelos

Hoje foi o dia da tomografia de corpo inteiro. Faz parte do procedimento de estadiamento, que vai dizer qual o estágio do câncer. Dependendo do grau, o tratamento muda. Foi um exame bastante rápido, sem complicações.

domingo, 1 de agosto de 2010

Laudo histopatológico

Nem o mais experiente desvendador de hieróglifos com toda a internet à mão é capaz de entender completamente o que vem num laudo desses. Aí vale toda a experiência do médico...
A minha biópsia confirmou o câncer. É do tipo mais comum, pelo que descobri: "carcinoma ductal invasivo da mama", o que significa que foi uma célula que compõe os canais que levam o leite que pirou; invasivo porque suas cópias desvairadas não se restringiram ao duto e ameaça tomar conta. Existe um grau histológico que é dado em várias escalas - a escala adotada no Brasil é a Nottingham, que vai de  1 a 3, sendo 1 o tumor mais bem comportado e 3 o mais ameaçador. O câncer de mama é, em geral, dos bravos, tipo 3. O meu é assim. A boa notícia é que não foram detectadas, na amostra "infiltração perineural ou invasão angiolinfática" e isso quer dizer que o tumor ainda não avançou sobre os nervos nem achou o caminho para se espalhar pelo sistema linfático, que é o meio de transporte preferido dele.
Alguns termos ainda são obscuros para mim: "tecido mamário adjacente com alteração de células colunares sem atipias e focos de hiperplasia ductal usual discreta".

terça-feira, 20 de julho de 2010

Quatro dias depois da biópsia

Quatro dias depois de ter feito a biópsia, foi assim que ficou. Coloquei bastante gelo, como indicado. A mama inchou um pouquinho no dia seguinte.Fiquei dois dias com um curativo de ponto falso, feito com esparadrapo. Esses hematomas são normais e já estão sumindo. Está mais intenso onde o soutien comprime a mama; o par de furinhos no centro da mancha amarela é onde foi introduzido o dispositivo de biópsia.São muito pequenos e fecharam logo. Apesar da mancha enorme, estou sem dor. O maior incômodo é uma feridinha redonda, na parte mais baixa da mancha, consequência de uma bolha embaixo do esparadrapo.

sábado, 17 de julho de 2010

A biópsia

Depois da tempestade, a tormenta. Depois de um BIRADS5, vem a biópsia. Sempre tive horror a biópsia, acho que é mexer em caixa de marimbondo. Mas não tem escapatória. Sem biópsia, não se sabe que tipo de tumor é, qual a invasividade, qual o melhor tratamento, qual a melhor cirurgia. Não se sabe nada. Então, não esperneie, faça a biópsia logo.
São três tipos, pelo menos. Na internet existe um trabalho muito legal de um médico radiologista do HC, Dr. Flavio Spinola de Castro, que mostra bem os três métodos. O trabalho foi feito para médicos entenderem, com certeza tem muita coisa lá que eu não entendo direito mas se tiver dúvida leve-a para o seu médico. Não fique com dúvida... Dúvida só atrasa.
A PAAF, punção aspirativa com agulha fina, é para nódulos que o médico acredita serem benignos, do tipo cisto, por exemplo, ou para checar os nódulos linfáticos. É uma injeçãozinha sem vergonha. Fiz uma vez faz muito tempo, no próprio consultório do ginecologista, que mandou o material para exame num laboratório.
A Core biopsy ou biópsia com agulha grossa (BAG) é feita com uma agulha mais grossa que é introduzida na pele por um pequeno furo (feito com bisturi). O médico introduz neste furo uma pequena sonda, com a agulha oca na ponta, e posiciona o dispositivo na borda do nódulo orientado pelo ultrassom. Quando está na posição, um gatilho dispara a agulha e neste trajeto, fica no interior oco dela uma tirinha com todas as camadas de tecido do caminho que a agulha percorreu.
A mamotomia ou biópsia assistida a vácuo é parecida, mas ela succiona o tecido de uma vez só. Ela tira fragmentos maiores, e dizem que pode sugar o nódulo todo se ele for pequeno. Quando existem muitas calcificações, ela dá um resultado mais confiável.
Quem vai escolher o melhor tipo é o seu médico junto com o radiologista. Eles vão conversar e decidir. Você entra com o peito e a coragem!
A que eu fiz foi a core ou BAG; foi tranquila, com anestesia local. Eu não senti nada além da primeira picada, que é menos dolorosa do que anestesia de dentista. Deu para acompanhar o procedimento pelo ultrassom, e ver o posicionamento da agulha, o disparo, tudo.  Depois do procedimento, fazem um curativo no furinho. Você tem que fazer compressas de gelo e ficar enfaixada por 24 horas, para não inchar. É ruim dormir com a faixa, mas nessa altura já somos super-fortes e sem frescura, se vier mel com abelha viva a gente engole... No dia seguinte fica dolorido e com hematoma, mas nem precisei tomar analgésico. Dorzinha vagabunda, um décimo de uma cólica braba...
Depois da biópsia, o material colhido vai para a análise anatomo-patológica, que vai dizer que tipo de células existem, se são cancerosas ou não, etc. Demora muuuuito esse resultado pra quem está explodindo de ansiedade. O que eu estou fazendo é fingir que não está acontecendo nada e aproveitar os próximos 15 dias para pôr a vida em ordem. Com tantas consultas e exames acabei deixando muita coisa acumular.

BIRADS

"BIRADS 5 - altamente sugestivo de malignidade"
Esse foi o texto que me bambeou as pernas. Acho que eu já desconfiava que tinha algo errado.
BIRADS é uma convenção, criada pelo American College of Radiology, a associação americana científica e profissional que estabelece os padrões de radiologia. A classificação BIRADS, que é a sigla para Sistema de Relatórios e de Dados de Imagens de Mama, é como os médicos convencionaram a forma de apresentar os resultados dos exames de imagem de mama. Assim, evitam interpretações erradas entre eles, e estabelecem uma forma bem confiável de comunicação. Antes, um médico podia ser gentil com o paciente e escrever um diagnóstico ruim de forma suave e delicada, que poderia ser mal interpretada pelo outro médico como se o problema fosse menos sério.
Com a classificação, não só eles se comunicam melhor mas estabelecem procedimentos padronizados com base nessa classificação. Isso ajuda a nós pacientes também, porque podemos entender melhor o que acontece conosco.
A escala BIRADS tem seis níveis.

BIRADS 0 significa que não é possível concluir nada; o radiologista precisa de mais informações, novos exames. Em geral, essa categoria é intermediária, dentro do procedimento, já que o radiologista vai tentar esgotar os seus meios para chegar numa conclusão.

BIRADS 1 é negativo, é o melhor presente do Papai Noel, é sua carta de alforria até o próximo exame de rotina. Significa que as mamas são simétricas, não há massas nem calcificações, todas as estruturas funcionais de glândulas, dutos e de sustentação estão lá bonitinhas. Abra um bom vinho, celebre, mas não deixe de fazer o seu próximo exame de rotina só porque você ganhou um BIRADS 1, porque só esses exames te mostram o que vai lá por dentro.

BIRADS 2 significa achados benignos. Também é negativo, mas um negativo que vem com achados ou alterações. O médico radiologista classifica assim porque ele quer sinalizar ao seu mastologista ou ginecologista que ele viu alterações, mas que elas são de um tipo benigno. Meu médico me disse que na medida em que a idade avança, as glândulas que produzem o leite vão murchando, criando tecidos mais fibrosos, aparecem calcificações nos vasos sanguíneos, formam-se cistos com gordura ou leite, e essas coisas são normais, acontecem com todo mundo. Essas alterações todas têm características muito bem conhecidas dos radiologistas, e eles sabem diferenciar uma coisa da outra. Isto é, existem "achados radiológicos" mas eles não são nada assustadores. Então, abra um bom vinho, melhor que o outro, porque você provavelmente vai estar mais velha e mais poderosa...

BIRADS 3 é um achado provavelmente benigno, mas que deve ser acompanhado. É mais ou menos a mesma coisa do nível 2, com uma alta probabilidade de ser benigno, mas vale a pena olhar com mais cuidado. Pelo que eu entendi do que andei lendo, o achado parece-se com alguma alteração benigna mas tem qualquer coisa que deixa o radiologista desconfiado.  Nesta categoria vale a intuição do médico, porque como a classificação BIRADS é muito recente, ainda não há dados para se saber sobre a evolução desses achados. Não deixe de abrir o vinho, e volte na hora certa para o acompanhamento.

BIRADS 4 é uma suspeita de anormalidade. Os seus médicos vão te pedir uma biópsia. Existe uma lesão que não tem todas as características, mas existe uma clara probabilidade de ser maligna. Seu médico vai decidir qual a melhor biópsia para o seu caso, mas não fuja dela. Se der negativa, abra seu vinho; se der positiva, abra do mesmo jeito porque você descobriu cedo e vai curar o câncer.

BIRADS 5 é muito provavelmente um câncer. O seu médico vai aconselhar as ações que você deve tomar, que provavelmente incluirão a biópsia. Aí é que você deve mesmo abrir o melhor vinho que você tiver. Depois de um BIRADS 5, você vai se encher de força e de coragem, e cada dia seu vai ter uma "quantidade de vida" imensa. Você vai viver intensamente, celebrar cada minuto na direção da sua cura, provavelmente vai querer chutar tudo o que detesta e curtir imensamente as pessoas que você adora. Pelo menos é o que está acontecendo comigo hoje.

Tatuagens

Eu não sabia o quanto era vaidosa e o quanto eu curtia meus enormes decotes, até pensar que uma cirurgia poderia remover parte ou o seio esquerdo inteiro. Perdi o sono e fui pesquisar como fica o tórax sem uma mama. Esquisito, desbalanceado, quase grotesco. Mas tem gente que sempre sai por cima. Achei essas tatuagens lindas que fizeram para esconder a cicatriz. Acho que facilita muito a vida para a gente se olhar no espelho.

A imagem saiu desta página aí, ainda não sei colocar link em imagem. Mas na página tem um texto legal, vale a pena visitar: http://www.upstate.edu/bioethics/thehealingmuse/05_muse/05_bsa_breast.php



Veja essa outra, que formidável! A foto está em http://quigleyscabinet.blogspot.com/2009/04/mastectomy-tattoos.html .Visite o post e leia frases das mulheres que resolveram transformar a cicatriz numa coisa bonita de se ver, ainda que seja só por você mesma.




Mais delicada mas com muita força é essa, que aproveita o ziguezague da cicatriz.

Começou assim

Estou com 49 anos agora. Fui fazer meus exames de rotina e me acharam uns cogumelos. Uns miomas pequenos, um cálculo renal, algumas má formações que eu já sabia que estavam ali. E a surpresa. Desconfiaram do nódulo que eu tinha na mama esquerda. Aí começou.

Na verdade, já tinha começado bem antes. Depois de amamentar o meu mais novo por 1 ano e dois meses, meu leite demorou a secar. Acho que depois de um ano e pouco, em 1992, me apareceu um nódulo dolorido na mama esquerda. Fiz meu primeiro ultrassom de mama. Tudo normal, nada visível no exame, mas o nódulo estava lá, eu conseguia sentir. Eu tinha 31 anos nessa época.

Em 1995 uma amiga querida teve um câncer de mama. Acho que aquilo me deixou preocupada, afinal eu tinha um nódulo palpável e não estava cuidando dele. Lá fui eu para o médico, reclamar do nódulo, e fui fazer a minha primeira mamografia. Dessa vez eu estava melhor de vida, fui para um laboratório particular que me espremeu muito, com muita grosseria, e lá estava o meu nódulo. Era um nódulo denso, na mamografia, e um cisto mamário no ultrassom.

Pânico total... minha avó morreu com câncer de mama. Minha mãe sempre foi neurótica e procura há 75 anos um câncer que ela nunca teve. Nessa hora, eu chorei muito... total falta de informação. O médico era um senhor já idoso, distante, enigmático, superior. A internet ainda não era o que é hoje. Ele me fez uma punção e uma análise do líquido que deu negativa. E o veredito - acompanharás esse nódulo de perto, de seis em seis meses.

Eu estava retomando a minha carreira, depois de ter parado por dois anos para cuidar do pequeno, estava começando a ter alguma projeção e importância. Tinha conseguido um emprego legal na minha área, Administração. Achando que eu ia morrer logo, abri mão dos projetos que estavam começando, abri a loja para ter mais liberdade, fui cuidar dos meus filhos que eram e são tudo de bom pra mim. Mas não morri... E o médico cobrando o acompanhamento, e eu fugindo. Até 1997.

Em 97 não deu pra fugir mais, o nódulo continuava lá. Fiz a segunda mamografia, terceiro ultrassom. Para a mamografia, tênue imagem nodular, para o ultrassom, mais um cisto, no mesmo lugar do outro que tinha sido drenado em 95. O que é isso, uma área produtora de cogumelos? E o médico, lá de seu alto trono, repetirás o exame em mais oito meses.

Obedeci. Comecinho de 98, já desesperada de novo, voltei à clínica para mais uma dobradinha. Eu continuava dividida... vou morrer e paro tudo para curtir a vida ou me lanço na vida e esqueço de tudo? Passei um pouco dessa angústia para o radiologista. É que eu acabei tendo um xilique na clínica, e cobrei uma posição definitiva - ou vocês me mandam daqui para a cirurgia ou vocês me liberam dessa chatice de acompanhar uma coisa sem fim. E....? O nódulo sumiu!!!  O laudo acusa total normalidade (mas ele estava lá, o tempo todo).

Aí eu sumi também... Quatro anos depois, mudei de médico e a nova médica me pediu o famigerado acompanhamento. Em 2002, lá estavam os cistinhos de 97, nenhuma lesão sólida visível. Achados benignos, BIRADS2. Na palpação, o nódulo continuava lá. E ela me explicou, são tecidos normais para a mulher da sua idade... antigamente se chamava displasia. Não é nada, vá cuidar da vida.  Oba... fase boa da vida... fui fazer mil coisas boas, curti muito, tive um acidente, me recuperei dele, a loja cresceu, diminuiu, cresceu de novo, diminuiu de novo...

E voltei à gineco, agora toda responsável, em 2004. De novo BIRADS2, plantação de cogumelos à toda, cheia de cistos pra todo lado. E o nódulo continuava lá.

Aí a vida foi complicando um pouco mais... 2006 passou voando, super envolvida com o trabalho, com os filhos moços, nem vi. E 2007, 2008, 2009, cada vez mais estresse, cada vez mais compromissos financeiros, acumulando meu trabalho e o que me cabia da empresa do meu marido, os pais envelhecidos com problemas de saúde, os filhos em vestibular, o marido começando crises de pânico. No começo de 2009, uma tireoidite me avisou que eu tinha esquecido de mim.  A vida tinha ficado muito complicada e a minha carga ficou muito pesada. As finanças foram para o brejo... dureza.

Chegou 2010, resolvi dar um tempo porque cansei. Planejei uma licença de tudo para pensar na vida e recompor as forças. Viajar uns tempos, só nós dois, antes de recomeçar. E vamos lá checar a saúde antes...

Tava lá o cogumelo. Dessa vez, BIRADS5. No mesmo lugar. Hoje fiz a biópsia pela manhã, estou enfaixada sem conseguir dormir.

Depois eu conto mais detalhes desse cogumelo.